Um conto de Bulwer-Lytton que revela o embrião de alguns temas recorrentes nas suas obras posteriores, e que reapareceriam em Zanoni, Uma Estranha História e Raça Futura: imortalidade, poderes misteriosos, ocultismo, mundos subterrâneos. Nas primeiras obras de ficção de Lytton já despontava o seu gosto pelo fantástico. O Mago, concebido quando ainda era estudante, revela o talento descritivo e a imaginação poderosa que o colocaria entre os autores ingleses mais lidos em sua época.
Texto de Bira Câmara
O Mago, ou O Conto de Kosem Kesamim, é uma das obras mais enigmáticas de Lytton, e apareceu em 1833 como parte do romance Asmodeus at Large, intercalando uma trama recheada de conteúdo sobrenatural. O próprio autor considera esta obra uma “miscelânea”, devido às constantes alusões ao real e a eventos temporais; mas o tema e a história são conduzidos por um “sentido metafísico”, como Lytton explica no prefácio. No romance, o narrador — entediado com a vida —, é abordado pelo demônio Asmodeu em uma excursão em busca de novas sensações; assiste a um sabbath, envolve-se com uma feiticeira, e encontra Kosem Kesamim, o maior bruxo de todos os tempos. Depois, passa algum tempo em Cyprolis, uma cidade subterrânea; viaja para o centro da terra e vê uma figura de pedra gigante, com inúmeras cordas emergindo dela — presumivelmente uma alegoria do Destino. Este texto revela o embrião de alguns temas recorrentes nas obras de Lytton, que reapareceriam em Zanoni, Uma Estranha História e Raça Futura: imortalidade, poderes misteriosos, ocultismo, mundos subterrâneos. O conto foi republicado em 1835 na revista New Montly Magazine, destacado do Asmodeu at Large.
Este conto, como o próprio autor revelou, é um poema em prosa que deveria ser posteriormente reelaborado numa obra mais pretensiosa, abordando o tema da imortalidade, entre outras questões metafísicas e filosóficas. Para Lytton, a principal dificuldade deste projeto seria evitar que se tornasse uma mera imitação do Fausto. O conto é praticamente o embrião de Zanoni, que veio a lume em 1842. Parábola bela, mas assustadora, sua mensagem é clara: mesmo para o iniciado na ciência secreta há um limite na busca do conhecimento, e não basta simplesmente saber, mas alcançar o conhecimento certo.Embora concebido quando ainda era estudante, o autor já demonstra em O Mago o talento descritivo e a imaginação poderosa que o colocaria entre os autores ingleses mais lidos em sua época. Há que se dar um desconto ao estilo por vezes pomposo, austero e elíptico desta narrativa — frases com longos períodos, o que se tornou uma marca do autor —, pois foi imaginada como um poema em prosa, onde o seu efeito dramático se concentra em grande parte na força das palavras.
Humor e magia
O conto chinês de Fi-ho-ti, ou Os Prazeres da Celebridade (1835) é outra produção dos tempos de estudante de Lytton, mas pode ser considerado como uma obra prima do conto filosófico. Despido do cunho fantástico e simbólico de O Mago, este texto se destaca pela ironia quase voltaireana, que há de agradar até aos leitores de nosso Machado e de Eça de Queiroz.
Em A Morte e Sísifo Lytton envereda pela narrativa mitológica, adotando um estilo leve e conciso, com um toque de humor que contrasta com a gravidade de outras obras suas. Este conto foi originalmente escrito na forma de poema, com versos brancos metrificados, nas pegadas dos grandes vates da velha Grécia. Nesta versão aqui apresentada, preferimos adotar a prosa tradicional, mais familiar ao leitor dos dias atuais. A narrativa foi extraída do livro The Last Tales of Miletus (1866), uma coletânea de contos em versos onde Lytton revisita alguns mitos gregos, temática que também sempre o cativou.
A Casa e o Cérebro é de 1857, quando o autor já estava consagrado pela publicação de Os Últimos Dias de Pompéia e Zanoni, entre outras produções. Enquanto O Mago é uma espécie de parábola ao estilo de Pöe, com toques faustianos, A Casa e o Cérebro relata uma eletrizante história de assombração com final inesperado, um conto que se tornou célebre e foi publicado em inúmeras antologias do gênero ao longo do tempo. Neste texto, Lytton consagra-se como um escritor em pleno controle do seu métier e não é por acaso que Lovecraft o considerou uma das melhores histórias de casa mal-assombrada escritas até hoje. O personagem maligno e imortal deste conto teria sido inspirado na figura do misterioso conde de Saint-Germain.Já o conto Daimon e Daimonos é uma curiosa antecipação do William Wilson, de Pöe. Note-se que este conto foi publicado em 1839, três anos depois da obra de Lytton, abordando o tema do duplo — o doppelgänger da mitologia germânica, que surgiu na literatura a partir do célebre romance de Hoffmann Os Elixires do Diabo. Mas o personagem de Lytton não é propriamente o «duplo», ou cópia idêntica do personagem, embora sem dúvida seja uma espécie de alter ego que passa a acompanhá-lo e assombrá-lo.
Apesar de seu exagero retórico e romântico, Lytton conseguiu encantar o público leitor com seus contos e romances de mistério, e tornou-se uma referência para os apreciadores da literatura fantástica e de terror.
O MAGO
E OUTROS CONTOS
Edward Bulwer-Lytton
Brochura, 144 páginas, formato 11 X 20 cm., 2014, Ilustrado, tradução de Júlia Câmara. Ilustrações de Odilon Redon, Friedrich John, R. H. Van Gulik e Bira Câmara.
PEDIDOS: jornalivros@gmail.com
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