No terceiro volume de sua trilogia sobre os mistérios da vida, Maeterlinck investiga as nascentes do misterioso rio que corre por todas as religiões, crenças e filosofias conhecidas
(Texto de Bira Câmara)
Dramaturgo e ensaísta, o conjunto da obra Maeterlinck é de uma variedade incomum e navegou na contra mão da tendência dominante, explorando admiravelmente sua principal preocupação: o que está por trás dos mistérios da vida? Seus escritos em prosa são combinações notáveis de misticismo, ocultismo e interesse pelo mundo da natureza em oposição ao materialismo, à ciência e à mecanização. Profundamente preocupado com questões como a imortalidade da alma, a natureza da morte, o sentido da vida e a obtenção da sabedoria, Maeterlinck dedicou-se a especulações místicas em boa parte de suas obras como em O tesouro dos humildes (1896) e Sabedoria e Destino (1898). Seus escritos em prosa mais lidos, no entanto, são dois ensaios extensos, A vida das abelhas (1901) e A Inteligênca das flores (1907), em que expõe sua filosofia da condição humana.
Figura literária consagrada, ganhador do prêmio Nobel em 1911, teve a coragem de aventurar-se pelas “regiões bastante depreciadas e pouco frequentadas” das sessões espíritas, do ocultismo e dos fenômenos paranormais. O resultado foi esta trilogia iniciada com o livro A Morte, seguida por O Convidado Desconhecido e fechada com O Grande Segredo.
Classificada levianamente por alguns críticos como “uma espécie de breve história do ocultismo”, esta última obra vai além e investiga as nascentes do misterioso rio que corre por todas as religiões, crenças e filosofias. Começando pela Índia sagrada, essa corrente sem dúvida se espalhou pelo Egito, pela antiga Pérsia, pela Caldeia, impregnou o povo hebreu, se infiltrou na Grécia e no norte da Europa, chegou à China e possivelmente até mesmo à América onde a civilização asteca tem inusitada similaridade com a civilização egípcia.
Portanto, há três derivações do ocultismo primitivo: a derivação Egito-Pérsia-Caldeia-Grécia (os “mistérios” religiosos gregos); Esoterismo judaico-cristão, com os essênios, os gnósticos, os neoplatônicos alexandrinos, os cabalistas da Idade Média; enfim, o ocultismo moderno, mais ou menos imbuído dos precedentes, que inclui não só os teosofistas, mas também os espiritualistas e todos os filósofos metapsíquicos de hoje. Dessas várias correntes, desde os textos mais antigos da literatura sagrada hindu até as várias manifestações do ocultismo moderno com Blavatsky, Besant, Steiner e os “metapsíquicos contemporâneos”, o autor pinta um quadro muito consistente no qual se esforça para provar que esses rios e correntes de ocultismo nos transmitiram poderes, sem dúvida muito mais espirituais do que os da mente moderna. Em resumo, para apreender e dominar esses poderes, devemos, portanto, espiritualizar-nos, cultivar o jardim de nossa alma, isto é, nosso subconsciente, por meio da renúncia e da concentração espiritual.
O estilo sugestivo e poético de Maeterlinck, a atmosfera purificada, povoada de paradoxos etéreos que nos escapam antes que se tenha tempo de apreendê-los, os sutis pontos de interrogação e um vago idealismo sentimental, difundido por toda parte, pontuam esta obra, eivada de reflexões poéticas sutis e engenhosas sobre temas que sempre fascinaram a humanidade.
Certamente O Grande Segredo deve desagradar a muitos religiosos das mais diversas correntes, bem como aos esotéricos em geral, e aos ocultistas em particular, pois não se trata de uma obra doutrinária e tem por objetivo tão somente a busca da verdade. E se reconhece, ao final, a impossibilidade de desvendar todos os mistérios de Deus, do universo e o sentido da vida do homem, pelo menos serve como uma bússola, um roteiro para quem pretende se aventurar por este terreno escorregadio e poupar o desperdício de tempo estudando uma tonelada de livros inúteis que só servem para espalhar confusão.
O Grande Segredo
Brochura, 204 páginas, formato 14 X 21 cm. Primeira edição em língua portuguesa. Tradução e prefácio de Bira Câmara.
PEDIDOS:
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